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PAPA FRANCISCO

MEDITAÇÕES MATUTINAS NA SANTA MISSA CELEBRADA
NA CAPELA DA CASA SANTA MARTA

Nunca escravos da lei

Segunda-feira, 24 de outubro de 2016

 

Publicado no L'Osservatore Romano, ed. em português, n. 43 de 27 de outubro de 2016

A rigidez do hipócrita nada tem a ver com a lei do Senhor, mas com «algo escondido, uma vida dupla» que nos torna escravos e nos faz esquecer que estar do lado de Deus significa viver «a liberdade, a mansidão, a bondade, o perdão». São precisamente estas as atitudes do cristão, que não deve fingir que é bom para mascarar «a doença» da rigidez. «Rezámos no salmo responsorial e repetimos a oração “bem-aventurados os que andam na lei do Senhor”» evidenciou imediatamente o Pontífice. E «dizendo isto — prosseguiu — pedimos a graça de caminhar na lei do Senhor, porque não é fácil, não é fácil caminhar na lei do Senhor».

Precisamente «o trecho do Evangelho de hoje – explicou o Papa fazendo referência ao excerto de Lucas (13, 10-17) – ensina-nos esta dificuldade de caminhar na lei do Senhor e indica-nos que é uma graça que devemos pedir: caminhar na lei do Senhor». Francisco realçou «neste trecho do Evangelho duas palavras fortes sobre a mulher: «libertada» e «prisioneira». Com efeito, Lucas escreve que «o diabo a manteve doente por dezoito anos e que Jesus a libertou». Mas isto foi feito no «sábado e a lei diz claramente que não se trabalha ao sábado». Aquela era «a lei antiga», afirmou o Papa, enquanto «a nova lei nos diz para não trabalhar ao domingo».

A cura realizada por Jesus suscita a indignação do chefe da Sinagoga que, prosseguiu Francisco, «sente o dever de repreender a mulher e diz: “vinde, pois, nestes dias para vos curar, mas não em dia de sábado que não se pode trabalhar!”». Todavia, ao ouvir estas palavras «Jesus responde com força: “Tu és um hipócrita! Por exemplo, o que fazes com o teu boi, com o teu jumento? Desamarra-lo para o levar a beber, a comer? E a ela não?”».

«Jesus — observou o Pontífice — repete muitas vezes a palavra “hipócrita” aos rígidos e a quantos assumem uma atitude de rigidez em cumprir a lei, que não têm a liberdade do filho: sentem que a lei se deve fazer assim e são escravos da lei». Ma «a lei não foi feita para nos tornar escravos, mas para para nos tornar livres, filhos» explicou Francisco. E São Paulo «pregou muito sobre isto; e Jesus, com poucas pregações, mas muitos factos, fez-nos compreender esta realidade».

«Hipócritas», recordou o Papa, é uma palavra que «muitas vezes Jesus repete às pessoas rígidas, porque por detrás da rigidez há sempre outra coisa». Por esta razão «Jesus diz “hipócritas!”: por detrás da rigidez há algo escondido na vida de uma pessoa». Com efeito, «a rigidez não é um dom de Deus; a mansidão sim; a bondade sim; a benevolência sim; o perdão sim, mas a rigidez não!».

Portanto, disse Francisco, «por detrás da rigidez há sempre algo escondido, em muitos casos uma vida dupla». Mas «há também algo doentio: como sofrem os rígidos e quando são sinceros e se dão conta disto, sofrem porque não conseguem ter a liberdade dos filhos de Deus; não sabem como se caminha na lei do Senhor e não são bem-aventurados. E sofrem muito». Assim, mesmo se «parecem bons, porque seguem a lei, por detrás há algo que não os torna bons: ou são maus, hipócritas ou são doentes». Contudo «sofrem».

Para esclarecer melhor o seu raciocínio, o Papa repropôs a história dos «dois filhos da parábola do filho pródigo» narrada por Lucas no seu Evangelho (15, 11-32). «O filho mais velho era bom», a ponto que «todos os vizinhos, todos os amigos do pai» diziam: «Que bom este filho, faz sempre o que o pai lhe diz!». Mas depois nos seus comentários acrescentavam: «Pobre pai com o segundo filho que foi uma catástrofe, foi-se embora com o dinheiro e leva uma vida impura, uma vida de pecador!».

Contudo, no final, a história «inverte-se e aquele pecador, que se foi embora, dá-se conta que se comportou mal e volta, pede perdão e o pai faz festa». Ao contrário, o filho «bom» está ali e mostra o que está por detrás da sua bondade». Ou seja, «a soberba de se julgar justo: “a ele faz-lhe festa, que é deste jeito, e a mim, que sou tão bom, que sempre te servi, não me fazes festa?”».

Eis, explicou Francisco, a atitude do «hipócrita: por detrás de fazer o bem, há soberba». Por sua vez, o filho pródigo, «sabia que tinha um pai e no momento mais difícil da sua vida foi ter com o pai». O filho mais velho, ao contrário, «compreendia apenas que o pai era patrão, mas nunca o tinha sentido como pai: era rígido, caminhava na lei com rigidez». Mais ainda: o filho pródigo «deixou a lei de lado, e foi-se embora sem a lei, contra a lei, mas a um dado momento pensou no pai, voltou e foi perdoado».

«Não é fácil caminhar na lei do Senhor sem cair na rigidez — disse o Pontífice — mas os rígidos, como já disse, sofrem muito». A tal ponto que inclusive o chefe da Sinagoga, do qual Lucas fala no Evangelho, «envergonhou-se porque Jesus fez com que ele raciocinasse» dizendo-lhe: «Mas não fazes isto com o teu jumento?». Ao contrário, a multidão inteira, lê-se ainda no trecho evangélico, exultava por todas as maravilhas realizadas por Jesus.

Em conclusão, o Pontífice convidou a rezar «pelos nossos irmãos e irmãs que pensam que caminhar na lei do Senhor significa tornar-se rígidos: o Senhor lhes faça sentir que é pai e que gosta da misericórdia, da ternura, da bondade, da mansidão, da humildade». E «a todos nos ensine a caminhar na lei do Senhor com estas atitudes».

 



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