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PAPA FRANCISCO

MEDITAÇÕES MATUTINAS NA SANTA MISSA CELEBRADA
NA CAPELA DA CASA SANTA MARTA

Companheiros de caminho

 Terça-feira, 2 de outubro de 2018

 

Publicado no L'Osservatore Romano, ed. em português, n. 41 de 11 de outubro de 2018

«Hoje, na festa dos Santos Anjos da Guarda, a irmã Pravina celebra o vigésimo quinto aniversário de vida religiosa. Rezemos por ela, ofereço-lhe a Missa, e desejamos-lhe outros vinte e cinco anos, pelo menos! Parabéns, irmã Pravina!». Com estas palavras, dedicadas a uma das religiosas filhas da caridade que prestam serviço na Casa Santa Marta, o Papa Francisco deu início à missa. Uma circunstância — um aniversário tão importante na vida de uma pessoa consagrada — que se ligou bem com a meditação que depois o Pontífice desenvolveu na homilia, na qual refletiu sobre a figura — o anjo da guarda — que o Senhor colocou ao lado do homem para o acompanhar ao longo do caminho «da vida». De facto, cada pessoa tem ao seu lado um «companheiro», um «protetor» que o Senhor concede ao homem como «amparo», para o impelir a erguer-se quando cai, para o orientar quando erra o caminho. Mas o homem compreende a riqueza deste dom? E, sobretudo, ouve a voz deste guardião especial?

A reflexão do Papa inspirou-se na primeira leitura do dia, tirada do livro do Êxodo (23, 20-23), na qual «o Senhor promete uma ajuda muito particular ao seu povo e a todos nós que caminhamos pela senda da vida». Com efeito lê-se: «Vou enviar um anjo adiante de ti para te proteger no caminho e para te conduzir ao lugar que te preparei». E assim a Igreja celebra estes «nossos companheiros de caminho, os nossos protetores no caminho: os anjos, que nos protegem e estão precisamente connosco, a caminho». Porque, acrescentou Francisco, «é verdade: a vida é um caminho, e devemos ser ajudados para caminhar bem, pois no caminho há armadilhas, perigos». Um percurso no qual o homem corre facilmente o risco de perder as coordenadas: «temos necessidade de uma bússola: mas de uma bússola humana, ou de uma bússola que se assemelhe ao humano e que nos ajude a ver para onde devemos ir».

Antes de tudo, o homem deve enfrentar um primeiro perigo: o de «não caminhar». De facto, «quantas pessoas se estabelecem e não caminham, e durante toda a vida ficam paradas, sem se mover, sem nada fazer... É um perigo». Trata-se, explicou o Pontífice, de situações semelhantes àquela descrita nos evangelhos, nos quais se fala do homem «que tinha medo de investir o talento». Depois de o ter enterrado repetia: «Estou em paz, sinto-me tranquilo. Não poderei errar. Assim não corro riscos». Acontece o mesmo com muitas pessoas que «não sabem como caminhar ou têm medo de arriscar e param». Mas, disse o Papa, «nós sabemos que a regra é que quem fica parado nesta vida acaba por se corromper. Como a água: quando a água fica parada, chegam os mosquitos, põem ovos e tudo se corrompe. Tudo». Precisamente em situações semelhantes, acrescentou, «o anjo ampara-nos, impele-nos a caminhar».

Mas este não é o único risco no itinerário da vida. «Há outro perigo», que é «errar a estrada». Também neste ponto Francisco evocou experiências comuns a todas as pessoas: «Também nós — digamos a verdade — quantas vezes erramos o caminho, por não ouvir a inspiração do nosso companheiro de caminho ou os conselhos dos irmãos e irmãs». De novo, o homem é confortado por uma certeza: «o anjo está perto para nos ajudar a não errar o caminho. Está connosco para isto: porque se errares o caminho, no início é fácil corrigir, mas depois de muitos anos — tantos anos — vais longe, do lado oposto em relação a onde deverias ir».

Continuando a reflexão, o Pontífice indicou uma ulterior atitude perigosa. Com efeito, disse, «há algumas pessoas que caminham, mas não pela estrada: caminham na praça. Passeiam pela vida na praça. E vão, vão à praça, sempre assim. Algumas são muito criativas: entram na praça, mas dentro da praça vão de um lado para outro, como se fosse num labirinto». Mais uma vez uma imagem concreta para evocar e fazer compreender melhor uma realidade interior, espiritual: «O labirinto nunca te leva ao fim: permaneces preso nele». Acontece então que o homem se convence: «Não estou parado, caminho», mas não se dá conta de que não está a caminhar «na estrada». Também nesta situação o anjo vem «ajudar-nos a caminhar pela estrada».

Certamente, explicou o Papa, devemos reconhecer a realidade do anjo: «Devemos pedir-lhe: “Ajuda-me”». Também nas Escrituras se lê: «Respeita a sua presença». Porque «o anjo tem poder, tem autoridade para nos guiar», mas é preciso «ouvi-lo», é necessário «ouvir as inspirações que vêm sempre através do Espírito Santo, mas é o anjo que nos inspira».

Neste ponto Francisco dirigiu-se aos presentes: «Mas gostaria de vos fazer uma pergunta: falais com o vosso anjo? Sabeis o nome do vosso anjo? Ouvis o vosso anjo? Deixais que vos guie pela mão na estrada ou que vos estimule para vos mover?». Tratou-se de uma solicitação para levar todos a uma tomada de consciência importante, porque «a presença do anjo na nossa vida não só existe para nos ajudar na estrada» mas também para «nos fazer ver onde devemos chegar».

A tal propósito o Pontífice evocou também o evangelho do dia (Mt 18,1-5.10) no qual Jesus diante dos discípulos que se questionavam: «Mas quem é o maior no reino dos céus?», pega numa criança e diz «algo muito bonito». De facto, afirma: «Esta é a maior» e, prosseguindo, exorta a não desprezar as crianças porque «os seus anjos no céu veem sempre o rosto do meu Pai que está nos céus». Este é um pormenor importante: «O nosso anjo — evidenciou o Papa — não só está connosco, mas vê Deus Pai. Está em relação com ele. É a ponte diária, desde o momento em que despertamos até à hora em que vamos para a cama, que nos acompanha e é um vínculo entre nós e Deus Pai». Portanto «o anjo é a porta quotidiana para a transcendência, para o encontro com o Pai»: isto é, ele «ajuda-me a continuar porque olha para o Pai e conhece a estrada».

Eis então a exortação final de Francisco — «não nos esqueçamos destes companheiros de caminho» — e o conselho: «Cada um pense: rezo ao meu anjo? Ouço as suas inspirações? Reflito quando ouço que há algo que me está a dizer? E sei, tenho certeza de que ele é uma ponte para chegar ao Pai, porque ele está a fitar o Pai?». Foi esta a oração conclusiva do Papa: «O Senhor conceda a todos nós, nesta festa dos anjos da guarda, a graça de compreender este mistério do amparo do anjo, da companhia na estrada, e da contemplação do anjo. A contemplação de Deus Pai».

 



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