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PAPA FRANCISCO

MEDITAÇÕES MATUTINAS NA SANTA MISSA CELEBRADA
NA CAPELA DA CASA SANTA MARTA

A atmosfera e o espaço

 Quinta-feira, 16 de junho de 2016

 

Publicado no L'Osservatore Romano, ed. em português, n. 25 de 23 de junho de 2016

«Pai» é a palavra que nunca pode faltar na oração, porque é «a pedra angular» que «nos confere a identidade cristã». Se acrescentarmos também a palavra «nosso», eis que nos podemos sentir todos parte de «uma família». E assim conseguimos também «não desperdiçar palavras» nem procurar «palavras mágicas», mas viver até ao fim a oração que o próprio Jesus nos ensinou — precisamente o Pai-Nosso — sobretudo quando nos convida a saber perdoar o próximo. É um convite a fazer «um exame de consciência» sobre o Pai-Nosso, a proposta sugerida pelo Papa.

Para a sua reflexão, Francisco inspirou-se no trecho evangélico de Mateus (6, 7-15) proposto pela liturgia. «Algumas vezes — recordou — os discípulos pediram a Jesus: “Mestre, ensina-nos a rezar”». Com efeito, «não sabiam rezar, ou viam como oravam os discípulos de João e pediram a Jesus». Por sua vez, o Senhor «é claro, simples no seu ensinamento: “Primeiro — diz — quando orardes não multipliqueis palavras como os pagãos: eles julgam que serão ouvidos à força das palavras”».

«Talvez Jesus — explicou o Papa — tivesse em mente os profetas de Baal, no monte Carmelo, que na oração gritavam ao seu ídolo, ao seu deus». Os sacerdotes de Baal «oravam, saltavam de um lado para o outro, feriam-se: não, multiplicar palavras é um desperdício; não isto não é oração». Os pagãos, diz Jesus, «julgam que serão ouvidos à força das palavras», como se fossem «palavras mágicas». Por isso Ele recomenda: «Não sejais como eles, Deus não precisa de palavras», porque «o vosso Pai sabe o que vos é necessário, antes que lho peçais».

«Jesus — observou Francisco — põe de lado esta oração de palavras, só de palavras», e diz: «Orai assim». Por isso, «indica-nos precisamente o espaço da oração numa palavra: “Pai”». Sim, Deus «sabe o que nos é necessário, antes que lho peçamos; este Pai que nos ouve às escondidas, secretamente, como ele, Jesus, aconselha a rezar no segredo». Um Pai, prosseguiu o Papa, «que nos confere precisamente a identidade de filhos». Assim, «quando digo “Pai” chego às raízes da minha identidade: a minha identidade cristã é ser filho, e esta é uma graça do Espírito», porque «ninguém pode dizer “Pai” sem a graça do Espírito».

«Pai», afirmou o Pontífice, «é a palavra que Jesus usava nos momentos mais fortes: quando se sentia cheio de alegria, de emoção: “Pai, louvo-te porque revelaste estas coisas às crianças». Ou então «chorando, diante do túmulo do seu amigo Lázaro: “Pai, dou-te graças porque me ouviste”». E também na angústia, «nos últimos momentos da sua vida: “Pai, se for possível afasta de mim este cálice”». Depois, «quando tudo acabou» diz: «Pai, nas tuas mãos entrego o meu Espírito”». Em síntese, insistiu Francisco, «nos momentos mais fortes Jesus diz: “Pai”, é a palavra que Ele mais usa». E «Ele fala com o Pai: é a via da oração e por isso permiti-me dizer, é o espaço da oração».

Eis por que razão, explicou o Papa, «sem sentir que somos filhos, sem nos sentirmos filhos, sem dizermos “Pai”, a nossa prece é pagã, é uma oração de palavras». Sim, afirmou, é bom orar a Nossa Senhora porque Ela é uma filha muito amada pelo Pai». O mesmo vale para os santos, que «são todos amados pelo Pai» e intercedem por nós. E também para os anjos. «Mas a pedra angular da oração é “Pai”», afirmou aconselhando a dizer «Pai» e depois a orar. Pois «se não fores capaz de começar a prece dizendo com coração e a com a boca a palavra “Pai”, a oração não será boa».

Trata-se, disse ainda, de «sentir o olhar do Pai sobre mim, sentir que a palavra “Pai” não é um desperdício como as palavras das preces dos pagãos: é uma chamada àquele que me conferiu a identidade de filho». É «este o espaço da oração cristã — “Pai” — e é neste contexto que oramos a todos os santos e anjos, que fazemos procissões e peregrinações». «Tudo é bom — acrescentou — mas comecemos sempre com “Pai”, conscientes de que somos filhos e temos um Pai que nos ama e que conhece todas as nossas necessidades: é este o espaço».

Mas, admoestou, «há algo curioso; Jesus recita o “Pai-Nosso”, a prece que todos conhecemos, e ensina a rezar assim: “Não nos deixeis cair em tentação, mas livrai-nos do mal”». E «imediatamente» acrescenta: «Se perdoardes aos homens as suas ofensas, o vosso Pai celeste também vos perdoará. Mas se não perdoardes aos homens, também o vosso Pai não vos perdoará». Parece quase, explicou o Papa, «que Jesus se tinha esquecido de frisar as palavras da sua oração — “e perdoai-nos as nossas ofensas, assim como nós perdoamos a quem nos tem ofendido” — e continua “não nos deixeis” e depois “mas não, devo realçar isto!”».

Portanto, afirmou, «se o espaço da oração é dizer “Pai”, a atmosfera da oração é dizer “nosso”: somos irmãos, somos família». Mas se «nos zangarmos uns com os outros, se estivermos em guerra, se nos odiarmos, impediremos o amor do Pai». E «esta é a atmosfera, a família, todos filhos do mesmo Pai: posso odiar o filho do meu Pai? Mas Caim fê-lo! Torno-me Caim!».

Em síntese, dizer «Pai-Nosso» significa dizer: «Tu que me conferes a identidade, Tu que me dás uma família». Por isso, disse o Papa, «é tão importante a capacidade de perdoar, de esquecer as ofensas, este hábito sadio: “deixemos estar... que o Senhor pense nisto”, sem rancor, sem ressentimento, sem vontade de vingança». Assim, «se orares e disseres apenas “Pai”, pensando naquele que te deu a vida, te confere a identidade e te ama, e disseres “nosso” perdoando a todos, esquecendo as ofensas, é a melhor prece que podes recitar». Neste contexto, reiterou, «rezamos a todos os santos e a Nossa Senhora, mas o fundamento da oração é “Pai-Nosso”».

Enfim, Francisco sugeriu que «por vezes» façamos também «um exame de consciência sobre isto». E propôs ainda as perguntas que devemos fazer a nós mesmos: «Para mim Deus é Pai, sinto-o como Pai? E se não o sinto assim, peço ao Espírito Santo que me ensine a senti-lo assim? Sou capaz de esquecer as ofensas, de perdoar, de deixar estar, de pedir ao Pai: “também eles, que são teus filhos, cometeram uma injustiça contra mim, ajuda-me a perdoar”?». Eis o «exame de consciência» que devemos fazer: «isto ajudar-nos-á muito». Tendo sempre bem presente que as palavras «Pai» e «nosso» nos conferem «a identidade de filhos» e nos dão «uma família para caminharmos juntos na vida».

 


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