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PAPA FRANCISCO

MEDITAÇÕES MATUTINAS NA SANTA MISSA CELEBRADA
NA CAPELA DA CASA SANTA MARTA

Entre o fazer e o dizer

Terça-feira, 23 de Fevereiro de 2016

 

Publicado no L'Osservatore Romano, ed. em português, n. 08 de 25 de Fevereiro de 2016

De nada serve autoproclamar-se cristãos, porque «Deus é real» e é pelo «fazer», não certamente pela «religião do dizer». Foi uma evocação à essencialidade da vida cristã a que o Papa propôs — com o convite a um exame de consciência sobre as bem-aventuranças e em particular sobre o próprio testemunho em família — na missa celebrada a 23 de fevereiro, na capela de Santa Marta.

«A liturgia da palavra hoje introduz-nos na dialética evangélica entre o fazer e o dizer» observou imediatamente Francisco, referindo-se ao trecho do livro do profeta Isaías (1, 10.16-20). «O Senhor chama o seu povo a fazer: Vinde, tratemos». Falemos e «deixai de praticar o mal, aprendei a praticar o bem, procurai a justiça, socorrei o oprimido, fazei justiça ao órfão, defendei a causa da viúva». Resumindo «fazei, praticai obras», porque «Deus é real».

De resto, o próprio Jesus afirmou: «Não aqueles que me dizem: “Senhor, Senhor” entrarão no reino dos céus mas aqueles que fizerem obras!». Portanto «não os que dizem» e chega, mas os que «fizerem a vontade do Pai». Assim o Papa recordou que «o Senhor nos ensina o caminho do fazer». E, acrescentou, «quantas vezes encontramos pessoas — inclusive nós mesmos — na Igreja» que proclamam: «Sou muito católico!». Mas, temos vontade de perguntar, «o que fazes?». Por exemplo, observou Francisco, «quantos pais se dizem católicos mas nunca têm tempo para falar com os seus filhos, para brincar com eles, para os ouvir». Ou ainda, prosseguiu, «os seus pais estão numa casa de repouso, mas eles estão sempre ocupados e não podem ir visitá-los, deixando-os abandonados». Contudo repetem: «Sou muito católico! Pertenço à associação tal...».

Esta atitude, afirmou o Papa, é típica da «religião do falar: digo que sou assim, mas pratico a mundanidade. Como os clérigos sobre os quais falava Jesus». Eles «gostavam de se mostrar, da vaidade, mas não da justiça; gostavam de ser chamados mestres, gostavam do dizer e não do fazer».

Uma realidade evocada também pelo trecho evangélico da liturgia, tirado do capítulo 23 de Mateus (1-12). «Pensemos — disse o Papa — naquelas dez jovens que eram felizes, porque naquela noite deviam esperar o esposo. Estavam felizes! Mas cinco delas fizeram o que deviam para esperar o esposo; as outras cinco estavam nas nuvens». E assim, prosseguiu, quando «chegou o esposo faltava-lhes o óleo: eram insensatas».

«Dizer e não fazer é um engano» advertiu o Pontífice. É «um engano que nos leva exatamente à hipocrisia». Precisamente «como Jesus diz daqueles clérigos». Mas «o Senhor vai além: que diz àqueles que se aproximam dele para fazer?». As suas palavras são: «Coragem, vinde e falemos! Mesmo se os vossos pecados fossem vermelhos como escarlate, tornar-se-iam brancos como a neve. Se fossem como púrpura, tornar-se-iam como lã».

Por isso, explicou Francisco, «a misericórdia do Senhor consiste em fazer». Assim «àqueles que batem à porta e dizem: “Mas, Senhor, recordas, eu disse...”», ele responde: «Não te conheço!». Ao contrário, a quantos «fazem» diz: «És pecador como o escarlate, tornar-te-ás branco como a neve». Deste modo «a misericórdia do Senhor vai ao encontro de quantos têm a coragem de se confrontar com ele, mas confrontar-se sobre a verdade, sobre as coisas que faço ou não faço, para me corrigir». «Este é o grande amor do Senhor, nesta dialética entre o dizer e o fazer».

Eis que, relançou o Papa, «ser cristão significa fazer: fazer a vontade de Deus». «No último dia — porque todos nós teremos um — o que nos perguntará o Senhor? Dir-nos-á: “O que dissestes sobre mim?”. Não! Quererá saber quais as obras que fizemos». Resumindo, nos interpelará sobre «as coisas concretas: “Tive fome e destes-me de comer; tive sede e destes-me de beber; estava doente e viestes ter comigo; estava preso e viestes visitar-me”». Porque «esta é a vida cristã». Ao contrário, «só falar leva-nos à vaidade, àquele fazer de conta que somos cristãos. Mas, assim não somos cristãos!».

No centro do tempo que nos aproxima da Páscoa «neste caminho de conversão quaresmal», Francisco propôs um exame de consciência, sugerindo que nos façamos algumas perguntas: «Sou daqueles que falam muito e nada fazem ou faço algo? Procuro fazer mais?». O objetivo, afirmou, é «fazer a vontade do Senhor para praticar o bem aos meus irmãos, àqueles que estão próximos de mim».

Na conclusão, antes de retomar a celebração eucarística, o Papa convidou a rezar a fim de que «o Senhor nos dê esta sabedoria de compreender bem onde está a diferença entre o dizer e o fazer e nos ensine o caminho do fazer ajudando-nos a segui-lo, porque a via do dizer nos leva ao lugar onde estão os doutores da lei, os clérigos que gostavam de se vestir e parecer como reizinhos». Mas «esta não é a realidade do Evangelho!». Eis então a oração a fim de que «o Senhor nos ensine este caminho».

 


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